‘Bati na trave’, diz brasileiro que criou teoria base para ganhadores do Nobel de física
Teoria desenvolvida por Almir Caldeira há mais de 40 anos foi base para experimentos que renderam o prêmio a pesquisadores britânico, francês e americano.
Por Poliana Casemiro, g1

Físico brasileiro é citado em Nobel de Física e celebra reconhecimento da ciência nacional
“Bati na trave”. Foi assim que o físico Almir Caldeira reagiu ao descobrir que seu nome estava no documento científico que embasou o Nobel de Física de 2025. Ele não ganhou o prêmio, mas a teoria que desenvolveu há mais de 40 anos ajudou a construir o caminho que levou os vencedores à conquista.
O britânico John Clarke, o francês Michel H. Devoret e o americano John M. Martinis ganharam o Nobel esta semana pela descoberta de efeitos quânticos em circuitos elétricos, capazes de demonstrar que as leis “bizarras” da física quântica também se aplicam a sistemas grandes o suficiente para caber na palma da mão. (Entenda mais abaixo)
Se depender da onda de sorte do time do coração de Amir, o Flamengo, pode ser que ele seja um laureado nos próximos anos. Caldeira fez a graduação e o mestrado na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e conclui o doutorado na University of Sussex, no Reino Unido. Atualmente, é professor titular da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e bolsista de Produtividade em Pesquisa 1A do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.

Nome de Amir Caldeira aparece em documento do Nobel — Foto: Reprodução
Nome de Amir Caldeira aparece em documento do Nobel — Foto: Reprodução
A pesquisa do brasileiro no Nobel
🔎 Para entender: a física quântica descreve o comportamento das partículas — como elétrons, fótons e átomos — em escalas minúsculas, onde as leis que conhecemos deixam de valer.
Nesse mundo microscópico, as partículas podem, por exemplo, estar em dois lugares ao mesmo tempo, atravessar barreiras sólidas e até existir em mais de um estado simultaneamente.
Esses efeitos nunca haviam sido observados em sistemas grandes, porque qualquer interação com o ambiente faz as partículas “perderem” seu comportamento quântico e voltarem ao “mundo normal”. Como você, que não consegue atravessar barreiras.
A resposta do porquê isso não acontecia em “tamanho maior” estava com o brasileiro. Em 1981, Almir Caldeira desenvolveu um modelo teórico que buscava responder a essa, que era uma das perguntas centrais da física moderna:
🔎 Como o ambiente em volta de um sistema influencia o comportamento quântico dele?
O trabalho de Amir mostrava que, quando um sistema quântico interage com o meio externo — por exemplo, com moléculas de ar ou calor —, ele pode perder suas propriedades quânticas e começar a agir como no “mundo normal”.
Essa ideia se tornou essencial para entender como preservar o estado quântico em experimentos e aplicações tecnológicas.
➡️ Décadas depois, os ganhadores deste ano usaram justamente essa base para transformar a teoria em prática. O experimento deles foi o passo seguinte: mostrou que o que Caldeira previu matematicamente podia, de fato, ser observado e controlado.
É isso que permitiu o avanço em áreas como a computação quântica, um campo que promete revolucionar o processamento de informações e a simulação de materiais complexos.
➡️ O trabalho de Caldeira tem reconhecimento mundial e já foi citado mais de cinco mil vezes em outras pesquisas. O modelo que ele desenvolveu segue sendo uma das referências mais utilizadas no estudo da decoerência quântica, que é o processo que faz um sistema deixar de se comportar como quântico.
Orgulho e recado para a ciência brasileira
Para o pesquisador, a menção é também um lembrete do potencial da ciência feita no Brasil.
Aos 75 anos, mesmo aposentado, Amir segue como professor e conta que vem trabalhando na formação de físicos que se tornam líderes de projetos, experimentos revolucionários e centros de pesquisa pelo mundo.
“Temos competência, temos pessoas excelentes. O que precisamos é de investimento para que a ciência seja desenvolvida no país”, afirmou.